quinta-feira, fevereiro 05, 2004

Um sentir português

Interrogo-me muitas vezes sobre a natureza do nosso encantador povo português. E de quando em vez leio algumas coisas muito pertinentes, mas que são extraordinariamente paradoxais com a própria existência de um povo.

É o caso da entrevista do filósofo Pinharanda Gomes à revista Actual do Expresso, no dia 31 de Janeiro de 2004. Afirma:

«Um povo existe como consciência de si mesmo para o seu fim. Carece de a si mesmo se interrogar a cada momento e de a cada momento inquirir se está com rigor no seu curso, ou se acaso sofreu um desvio. (...) Um povo que não se pensa a si mesmo na relação essencial, axiológica, com o outro, não merece o privilégio de existir.»

Fundamental esta reflexão. Merecemos existir, em minha opinião, pois pensamos, numa espécie de tirada 'descartiana'. Pensamos sobre nós, mas é um pensamento viciado, estruturado em torno de 'clichés' como o do país triste, infeliz, pequenininho e à beira-mar plantado, portanto, periférico. Mas é aqui que reside o fulcro da questão. A perificidade geográfica é um determinismo inultrapassável; a perificidade no pensamento não.

O que sucede é que pensamos ainda presos ao passado, sempre esperando pelo D. Sebastião que por magia nos venha mudar a todos. O processo de mudança de mentalidades, de atitudes, de comportamentos é gradual, é isso mesmo, um 'processo'. Estamos numa fase de estagnação, que eu prefiro considerar aquele ponto da curva em que paramos para fazer o balanço do percurso. Tivemos altos e baixos; temos de conseguir discernir onde estamos, devemos conseguir pensar para onde queremos ir, com a capacidade realística de analisar os recursos que temos à nossa disposição.

Vamos sonhar, dia-a-dia, sempre com os pés sempre bem assentes no chão, mas com audácia e deixando de pensar pequeno.